Há palavras demais em nosso idioma
COLUNA
MUSEU DE TUDO
por Theo G. Alves

Há palavras demais em nosso idioma e uma profusão ainda maior de palavras no mundo e todos sabemos que ninguém precisa delas, ao menos não de tantas, especialmente das palavras que esvaziamos e encardimos ao longo do tempo pelo mal uso ou pelo excesso. Há palavras demais e este é o fato.
Por isso, talvez seja a hora de cortarmos pela metade nossas conversas e reduzirmos esta crônica em apenas alguns pares de aforismos. Já tivemos amostras suficientes dos discursos públicos que rodam em torno da verdade sem a tocar ou de poemas incapazes de dizer o que exigem coração e palavra. Para que serve um poema que não cabe num para-choque de caminhão?
Nossos nomes tornados palavras também são um exagero. Se mesmo o nome de Deus não deve ser pronunciado, que queremos nós a sermos chamados e enumerados em listas para todas as inutilidades deste mundo?
Há palavras demais, meus caros. Ninguém precisa de novas orações ou de livros novos, lutando para serem inventivos e contando histórias improváveis. Se temos Shakespeare e Borges, para que haveremos de seguir contando histórias? Tudo já foi dito por um e repetido pelo outro, por isso qualquer tentativa de nova literatura é mexer um caldeirão em que o único ingrediente disponível é água.
Penso que poderíamos resumir todo o nosso idioma em seis ou sete palavras e tudo o que não coubesse nelas não seria digno de ser mencionado. Poderíamos ouvir muito mais do que falar e só aquilo que fosse extremamente belo e preciso seria dito, algo como uma evocação dos espíritos que um dia habitaram as palavras, mas que foram expulsos delas por nós, sempre exagerados de usos e floreios.
Qual a utilidade das palavras vida e morte, por exemplo, se são reflexos uma da outra? Quem diz viver está também a dizer morrer, mesmo que não se dê conta disso. É o que se dá com a palavra esquecimento: um paradoxo esdrúxulo (como esdrúxulas são as palavras paradoxo e esdrúxulo), pois esquecer de fato desabilita a palavra que o menciona.
Precisamos de menos palavras, não tenho mais dúvidas.
Esta crônica é prova disso: um excesso, um abuso. Cheia de repetições e rodopios absolutamente desnecessários, exercícios de contorção e malabarismos linguísticos que servem de nada, senão para provar que há palavras demais em nosso idioma.
Sei o quanto vale uma palavra, eu juro. Por isso peço para que as usemos menos: um gesto, um movimento, um uivo ou um grito são melhores que muitas das palavras que representam. Então, aceitemos: é chegada a hora de dizer pelo não dito.
Silêncio é uma palavra contraditória. Barulho, não.

Theo Alves é escritor e fotógrafo, publicou vários livros de contos e poesias e atualmente é colunista do periódico Potiguar Notícias (RN). Como fotógrafo, dedica-se em especial à fotografia documental e de rua. Também ministra aulas de fotografia digital com aparelhos celulares em projetos de extensão do IFRN, onde é servidor.
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