top of page

Sem hora

CRÔNICA


Júlio tinha uma excursão agendada para sábado de manhã. Deveria chegar cedo ao local de encontro para juntar-se à turma e fazer todo o percurso coletivamente durante o dia. Na sexta-feira à noite, antes de dormir, programou o relógio despertador para às 5h da manhã. Assim teria tempo para tomar um belo banho, faria a barba e ainda sobraria tempo rever os últimos detalhes da mochila e tomar um café reforçado. Já havia garantido o pão, os frios e até um bolo de laranja comprado no mercado. Acordar cedo o prepararia para o dia intenso que teria. Dormiu pensando que enfim conseguiria ir ao passeio que há três meses aguardava.


Quando Júlio abriu os olhos, pensou que não tinha conseguido dormir direito, pois não ouvira o despertador. Olhou para o relógio na mesinha ao lado da cama e estava piscando os números, desconfiado de que havia faltado luz durante a noite, resolveu conferir o celular e pasmem, eram 7 horas e 30 minutos. Pulou da cama num sobressalto, às 8h tinha de estar no ponto de encontro. Não tomou banho, não fez a barba, não tomou café e nem pegou as garrafinhas de água que havia separado para levar, enquanto isso pedia um táxi por telefone, chamar um Uber poderia demorar mais. Por sorte, lembrou-se de pegar a mochila. Desceu correndo os quatro andares de escada de seu prédio, sem fôlego chegou à calçada da rua e nada do táxi, eram 7h e 45 minutos. O táxi chegou às 7h e 50 minutos. Jogou-se dentro do carro e, praticamente gritou seu destino ao motorista, pedindo-lhe que voasse, pois estava atrasado. O motorista do táxi olhou desconfiado aquele rapaz de barba cerrada e descabelado. E disse-lhe que faria o máximo possível, considerando as Leis de trânsito. Iniciava assim sua excursão e Júlio estava ansioso. Andaram três quadras e tiveram de parar. Havia um acidente de carros, dois veículos colidiram-se levemente, mas o suficiente para que o trânsito parasse totalmente. O motorista do táxi, conhecedor das ruas e avenidas, sujeito atento e profissional, consegui contornar por uma rua lateral, porém, aumentaria um pouco o trajeto. Júlio pensou que o pessoal da excursão consideraria pequenos atrasos, com certa tolerância para os percalços da vida.


A ansiedade tomava conta de Júlio e suplicou ao motorista que acelerasse o veículo. Algo que não poderia ser feito num sábado pela manhã, em horário de intenso movimento nas ruas e com trânsito pesado. Faria o máximo que poderia, considerando ainda as Leis de trânsito e evitando multas. O rapaz começou a desconfiar de sua sorte. Olhava insistentemente o relógio do celular, conferindo os minutos, e infelizmente, o táxi não andava o tanto quanto ele desejava, ou queria, ou necessitava. Cegou ao ponto de encontro da turma às 8h e 20 minutos e nada do ônibus com o pessoal da excursão, olhou pra trás e o táxi já havia partido. Perguntou a algumas pessoas sobre o ônibus e descobriu que saíra às 8h e 15 minutos. Pensou que se conseguisse outro táxi, conseguiria alcançar o ônibus e faria o possível para embarcar. Em 5 minutos embarcava em outro táxi e explicou a situação ao motorista, suplicando ajuda. Não podia perder a excursão que estava planejada ha tempos e tampouco perder o dinheiro investido. Ao chegarem próximo da ponte que levaria a uma rodovia, estava tudo parado, a ponte era levadiça e nesse momento um navio atravessa o rio. Lembrou-se que tinha o número de celular de um dos guias da excursão, ligou desesperado, tinha esperanças de o ônibus estar parado na ponte e o alcançaria a pé, se fosse preciso. Após duas tentativas de ligação, o guia atendeu. Júlio explicou a situação em que se encontrava e sua ideia de alcançar o ônibus. O Guia disse-lhe que haviam esperado por ele na saída por 20 minutos, e que já haviam passado pela ponte, logo depois ela foi bloqueada para a passagem do navio. Disse-lhe que fariam uma parada de 10 minutos num posto a mais ou menos uns 30 quilômetros, e que poderia esperar por ele por até 10 minutos, sem prejudicar o restante do grupo e os horários de paradas. Combinado o novo ponto de encontro Júlio respirou e fez cálculos de cabeça, conversando com o motorista do táxi, concluíram que chegariam a tempo dele embarcar no ônibus da excursão.


Em 10 minutos a ponte estava liberada e o trânsito começou a andar. Não contavam com a morosidade do andamento. A quantidade de carros, de caminhões e a lentidão para realmente começarem a rodar na velocidade esperada. Assim que chegaram ha rodovia, o motorista de táxi andava no limite de velocidade e tentava sinalizar aos veículos com luz alta de que estava com pressa. Júlio tinha medo de olhar o relógio. Chegaram ao posto e surpreendentemente o seu ônibus tinha acabado de partir. Falou com o motorista de táxi se ele concordaria em tentar alcançar o ônibus novamente. O motorista informou que não podia, pois já tinha agendado outra corrida e precisava ir embora. Júlio ficou desolado e estava prestes a desistir quanto um dos atendentes do posto de combustíveis informou-lhe que um ônibus sairia em 15 minutos para o destino que ele procurava. A dúvida o consumiu, voltava pra casa com o taxista ou embarcava nesse ônibus para o destino tão aguardado. Decidiu seguir viagem e aguardar 15 minutos o ônibus, despediu-se do taxista, agradeceu ao atendente e dirigiu-se ao ponto de ônibus. Esperou, esperou e esperou. Os 15 minutos pareciam horas, o ônibus chegou em 25 minutos, embarcou rapidamente. Sentou-se no fundo do ônibus, a viagem levaria em torno de duas horas e cansado por causa da ansiedade adormeceu no banco. Nem percebeu que o ônibus era do tipo coletivo, ou seja, parava em vários locais para desembarque ou embarque de passageiros. A viagem que levaria 2 horas acabou levando 3 horas. Chegou ao local de encontro, mas a turma da excursão já havia partido no barco há mais de uma hora e era o último do dia.


Exausto Júlio sentou-se num bar próximo e resolveu esperar, afinal em duas horas a turma deveria estar retornando do passeio para retornarem as suas casas. Comeu um sanduiche e tomou um refrigerante bem devagar, afinal agora tinha tempo. Sem pressa, descansou na sombra de uma árvore próxima. O pessoal da excursão retornou e encontraram Júlio. Todos lamentaram o que havia acontecido e estavam tristes que Júlio não pode aproveitar cada momento do passeio com o grupo todo. Estavam todos muitos felizes pois o passeio tinha sido ótimo.


Todos embarcaram no ônibus que retornaria ao ponto de partida. Todos desembarcaram felizes e falantes e, ao despedirem-se Júlio conversou com o guia. Combinou e agendou uma nova excursão, a mesma que ele perdera no dia de hoje, para dali três meses, e dessa vez, ele iria fazer tudo diferente, e a primeira atitude seria a de comprar um despertador novo à corda.

 

Juliane Sperotto é especialista em Literatura Brasileira  pela UFRGS; graduada em Literatura e Língua Portuguesa  pela UNISINOS; escritora e uma das fundadoras e idealizadoras da revista Escape. Atualmente responde pela revisão ortográfica da revista e é uma das editoras associadas.

A revisão ortográfica deste texto é de total responsabilidade do seu autor ou assinante da postagem publicada. A revista Escape só responde pela revisão ortográfica das matérias, editoriais e notícias assinadas por ela.

23 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page